quinta-feira, 26 de setembro de 2013



CARA LISA, CARA DE PAU.
                (PARA RICARDO AS DUAS SERVEM. PORQUE ME AFASTEI DELE)
               Desencantos na minha vida pública levaram-se a me filiar e desfiliar ao PMDB, ao PT e ao PSB. Este último partido, recebia a orientação nacional de Miguel Arrais, um dos patriotas mais respeitáveis da nossa Nação, que se opunha corajosamente aos princípios do Neo-liberalismo, que sustentam a Globalização que governa o planeta, e que eu entendia, prejudicavam o nosso pais. Em notas pagas e divulgadas na imprensa da Paraíba e na internet, expliquei as minhas razões.
               Filiado ainda ao PSB, em contatos e reuniões com os professores universitários Antonio Nóbrega Gadelha e José Octávio de Arruda Melo, entre outros, e acadêmicos, elaboramos um projeto para criação de um ciclo de debates sobre Ciência Política, que trata na sua doutrina da vida democrática, dos partidos políticos, das instituições públicas enfim. A realidade nacional mostrava que existiam politicamente no país apenas duas frentes: Governo e Oposição, mascarando interesses escusos na incorporação de outras siglas partidárias nas suas teses. O povo contestava tal procedimento.
               Esclareço que Ricardo Coutinho estava filiado ao PSB, e o procurei no seu gabinete, onde não o encontrei, para entregar-lhe o convite para a abertura do ciclo de debates, que ocorreu no auditório da Faculdade de Direito de Sousa, depois UEPB Campina Grande, Unipê João Pessoa, UFPB e outros encontros, cujo convite deixei com o seu chefe de gabinete e alguns assessores que se ali se encontravam.
               Inspirados em sadias convicções político-democráticas colhidas em Rui Barbosa, paladino da Justiça e da Liberdade no nosso país, divulgávamos com entusiasmo a legenda por ele criada:  "Porque, cumpre sempre tê-lo em vista, o epírito da opressão, é um só, é o mesmo, nas mãos de Torquemada ou de Robespierre... a quem serve nesta ou naquela ocasião." ("Teoria Política" apud Homero Pires, W.M.Jacson, editores, 1964). Cumpre esclarecer, que o antes citado prefeito Ricardo Coutinho (revelando o seu caráter absolutista e desleal, logo de saída) a nenhum dos eventos compareceu ou mandou representante. O atual prefeito Luciano Cartaxo, então vereador, pode testemunhar sobre o fato, em contato telefônico que mantive com ele.
                Ricardo preferia outra convivência: Nei Suassuna et caterva, e vai por aí, com quem formou célebres coligações batizadas "cano de esgoto", via de escoamento de detritos morais da vida paraibana. Daí para frente, a sua presença na cena política tem sido, até parece, um proposital desacato aos bons princípios da moralidade, da ética política, da crueldade no desrespeito a direitos do funcionalismo público e de todos em geral. Envolvido em centenas de investigações e procedimentos policiais e judiciais, nas esferas estadual e municipal, cito apenas para ilustrar o Cuiá e a Jampa Digital. Boa coisa não fez. O cinismo agora é a marca do governo.
               Vejam esta: partindo da capital atravessa 436 km de estrada asfaltada por outros governantes, e inaugura com muita polícia e música  um trecho de 8 ou 20 km de  construção ou recapeamento asfáltico e berra possesso (um demente perigoso): "Este é o novo governo. Antes era o caos".  É Cara de Pau ou Cara Lisa?  As duas servem.


EZRA POUND,  HILDEBERTO  BARBOSA  E A  MATRIZ  DAS  LETRAS
            Sessenta e oito anos de empenho foi quanto levou a composição do “CANTOS” de Ezra Pound (Nova Froneira 2012), ele o afirma, e também contam os biógrafos e estudiosos de sua extensíssima obra literária. Não me proponho tiradas de sua vida de polígrafo, somente algumas breves referências, e registros dos historiadores e críticos da literatura. E colocá-lo ao lado do poeta paraibano Hildeberto Barbosa Filho. Avulta neste mister, atenção às anotações de fatos sucessivos e curiosos da controvertida personalidade intelectual do primeiro, que dominou a poética do século XX, traçan-    do novos rumos e construindo, na expressão de Hugh Kenner  “uma épica sem enredo”. As considerações alinhadas, propõem-se chamar também a atenção, igualmente, para a construção da obra poética do paraibano, com o lançamento do seu “NEM MORRER É REMÉDIO, Poesia Reunida” (Ideia, Pb 2012), um misto de lirismo e épica apo-tegmáticas. Poeta completo, cuja poesia quer ser apenas poesia, sem significado encoberto em títulos e representações. Tão jovem ainda e já tem lar, conta no banco, biblioteca, paisagens, lembranças, amores, passado, tradição.  
            Os comentários aqui reunidos, simplesmente são visões breves, sem erudição e desenvolvimento necessários, para tese tão abrangente e ao mesmo tempo indutora no campo da crítica e teoria da literatura.  Hildeberto, entretanto, isso quero dizer: não  é  nem será um anônimo intelectual, um suicida das letras.  Pelo con-trário, prende-se ao propósito de perpetuador da vida, porque, afinal, a manifestação maior de sua consciência é a antenada e inextinguível expressão do texto literário, que se propõe via e leito da crônica humana, como um ato da criação que se prende na eternidade.  
TS Eliot explicou-se: “com tais fragmentos foi que escorei as minhas ruínas, pois então vos conforto”. Mas Hildeberto  não falaria em ruínas, certamente o faria sobre arquétipos monumentais, da natureza humana em versos prosaicos ou, marcos para duração que se perderia no tempo, indestrutíveis, inapagáveis. A poesia tem essa força de criadora de mitos, de inspiradora de modos e modelos grandiosos.
 Acho interessante e curioso o sentimento pedagógico que está pre-sente na poética de Pound, na absorção e composição de palavras e textos em línguas estrangeiras, nos ideogramas chineses, no cavalheirismo e na ética provençal. Um cuidadoso mestre-escola, chega a parecer. São falas e comportamentos que ditam datas históricas. É um monumento literário descritivo de avaliações e julgamentos, como se fossem tirados da contabilidade de um banco, realidade tão recorrente na sua familiar crítica às construções financeiras, erguidas até ao relento e através de pilhagens sobre cadáveres insepultos pisoteados.
               Em poesia a forma é aglutinativa de sentimentos e palavras. Eis o que poderia ser considerado um axioma poundiano, envolvendo o ideograma e o metrômeno. Sempre ela a palavra, o Verbo, inscrito na voz dos poetas. Pound é mais narrativo, comparativo, exuberante: sabe do histórico e do eventual, do político, do brado e do silêncio;    Hildeberto,  registrando até minudências intemporais, a sua vida, que é a de todos, debruçado talvez  na  mesa de uma estalagem maldita, tocan-do a face nas tábuas úmidas e gordurentas, copia um atribulado personagem de Conrad. Romantismo? Não sei. Cientismo, pode ser, que se depreende da escolha  de um terceto do “Budismo Moderno” de Augusto dos Anjos, como epígrafe para o seu livro em questão. Nos dois o “espetáculo do amor em vastas e acesas clarabóias”.
              Inacreditável e legendário já se mostra, o fazer literário de Hilde-berto,  que descobre  o “orgasmo das pedras” lavadas pelas águas em turvas imagens, de assaz insondáveis grutas − os escaninhos da vida reprodutiva, orgânica e inor-gânica, por contato, metamorfose. As grandes questões, os movimentos e momentos ditos imperceptíveis, se interpenetram na sua poesia como termos de uma equação sem incógnitas, O fascinante momento da submissão de elementos quânticos ondulatórios, à irresistível doçura do lirismo feito em palavras. O desenrolar da vida marcando situações humanas, reduzindo-a aos ínvios circuitos do destino, à metá-fora do rio, que reproduz coisas assim, de primitivas e gigantescas abduções, consu-madas nas fraudes e nas seduções. Afinal disso vivemos e disso somente  tratamos.
 Não foi por acaso, que Monsieur Jourdain descobriu, que durante toda a sua vida, sem o saber, dialogava e argumentava em prosa. Os poetas, também sensíveis criaturas do povo, conhecem este procedimento. Pessoas com a mente em perpétuo movimento aglutinativo ditam conclusões, criam conceitos, propõem regras. Aludem a questões acima de vultos e personagens eruditos e prosaicos, clássicos e ordinários. A sede de álcool de Hildeberto, leva ao delírio – mera psicopatia – e equivale ao equívoco ético-político de Pound, aderindo ao fascismo, mero estado d´alma. Fogem do seu mister, não criam versos exemplares, que preparam  o cerimonial da própria morte, como acentuaria Rainer Maria Rilke. (continua)
               


  ASCENDINO LEITE – POESIA REUNIDA
(O VAQUEIRO “PRACIANTE”, SEM CAVALO, ESPORAS E GIBÃO)
       
              Ignoro se Ascendino Leite foi ou não aluno interno em seminário, em convento católico. Caso afirmativo, explicar-se-ia a sua condição de presa da libido, presente nos seus versos, numa forma de reação natural, talvez, ao isolamento forçado, à clausura.
Homem de letras, jornalista, Ascendino freqüentou os círculos da agitada  e esnobe vida social e política do país, os “circuitos” mais afamados da elite no Rio de Janeiro, então capital do país. E nesses ambientes alegres ou não, a palavra de ordem em qualquer tom era o prazer, o sexo, com e sem dissimulação. Esta a razão inspiradora dos seus versos, acredito, que levou o seu prefaciador Ivo Barroso a escrever: “Perpassa por todo o livro um erotismo sadio... de um ineditismo impossível depois do Kama Sutra.” Por seu turno  Hildeberto Barbosa vê a sua poesia  reunida  “...como um pequeno tratado dos sentidos, por onde trespassa o desejo como força regeneradora da vida.” Agrado. De minha parte, sem ofensa pessoal, mas com o respeito que lhe devo, como parente e escritor, nada melhor para fazer, nos anos finais de sua vida (depois dos oitenta), do que definir, ser este, o objeto e destino para sua poética. Um ato de coragem, ou dissimulação de amores impossíveis, negados. Nada mais lhe resta, ele sabe.
Entristeceu-me, é duro dizer, a leitura da “POESIA REUNIDA” do paraibano de Conceição de Piancó, a rigor, por lá não encontrá-los: ele, a cidade, a paisagem e as pessoas, como são. Falo em hábitos, costumes, relevo geográfico, coletividade, urbanização, genericamente, sobretudo da consciência, dos ali nascidos e que se fizeram naturalmente: as plantas, os bichos, as pedras, a água, o sol, a lua, as estrelas e o vento. Sabia-o telúrico, cangaceiral, encontrei-o, entretanto, reservado, polido, exercendo funções relevantes, administrativas, cartoriais, como outros  conterrâneos, dignos, de tempo mais recuado, e destaco Nicolau Rodrigues de França Leite e José Siqueira, regendo cátedras e filarmônicas, admirados e aplaudidos nas Américas, inclusive na Europa.
Essa questão de cultura e erudição, do clássico e do popular, pesa forte na consciência dos letrados, que, como tal, revelam-se entes sociais cuja formação os tipifica no proceder, na integração psico-material que os reúne em coletivida-    des como as bactérias e como as pessoas. Criam escolas, estilos na divulgação dos escritos, no seu comportamento, como as abelhas, as aranhas, enfim. Sempre um estilo. Literatura não é régua e compasso, mas espaço e signos ideográficos, lingüísticos, palavras e fidelidade e sentimento.  
 Ascendino, leitor compulsivo de autores nacionais e estrangeiros, tra-dutor, brilhando nas letras brasileiras, como outros, deixou-se vencer pelo “classicismo” letrado. Os temas, o sentimento nos seus escritos, podem estar
 voltados para o Vale, como denominamos a região tributária no rio que dá nome  à terra. Algo, todavia, atropela o seu estilo, logo ele, reconhecido entre os mais inspirados e conscientes escritores do país. Foge para outras paragens. Nos romances publicados e no seu jornal literário, é um mestre no nível de Osman Lins, Ivan Bichara, Ernani Sátiro, de Pedro Nava, de Álvaro Lins e outros notáveis do memorialismo literário nas Américas, na Europa. Não exijo na sua prosa de ficção, no seu memorialismo, estereótipos sociais, recolhimento e organização museológica de espécies biológicas, minerais, mas o que nasce de sua interação. Da paixão e do amor libidinoso ele fala. E da corte, dos salões, da amizade, da admiração afetiva.  
Sei de gente, de pessoas ilustres como ele, também do lugar, tresmalhadas em territórios estranhos, infensas, entretanto, à pressão colonialista dos chefes da sociedade que as recebe, como os negros nas Amércas. Está aí Elba Ramalho, cantora, atriz, noiteira, devota de Nossa Senhora, filha de Conceição. Uma que outra fugida para o carnaval, para o samba, se permite, ela da linha melódica do baião, do forró nordestino que ocupa com força e reconhecimento o seu lugar de  destaque na música popular brasileira, encarnando a força do semiárido. Mas até pelo tom da voz todos a identificam: É do Vale do Piancó, gritam. Cada qual com o seu cada qual, como lá se fala. 
Deixemos Ascendino com sua morada na rua escolhida para abrigar a inspiração, praticar a sua prosa a sua poesia. Porque a moderna tecnologia que absorve a atenção geral, no fim torna-se indesejável, não lhe interessa, porque se recria ela própria, anuncia-se com mudanças inesperadas, instantâneas, sons e ruídos desconhecidos, confunde ao se mostrar auto-suficiente, vencendo o tempo: o ontem, o hoje, o amanhã, misteriosamente sabidos e descritos à saciedade. Incompatível com  a reflexão fundada em sensações, fatos, experiências.
Li com muito agrado páginas do seu “jornal” e nelas deliciei-me com a beleza sonora das frases, a conclusão filosófica dos raciocínios. Argumentações, um misto de desencanto e esperança. Não reduzi a somenos a sua poesia, nos comentários acima. Jamais o faria. Chama-me a atenção, não que ele necessite, porém ilustra o verso e o torna viajor, as dedicatórias a pessoas, notáveis e simples, sentimentos  nem sempre singelos  declamados aqui e ali. Certamente o ambiente de Herbert Sales, Tom Jobim, Waldemar Duarte, Rosilda Cartaxo, do mundo das artes, e de políticos e empresários, dos conclaves e balancetes, reconheço, permite-lhe o sucesso de mascate das letras porque atinge o leitor certo, conquista o leitor privilegiado porque homenageado.
Mas sobre a sua poesia reunida, com flash-backs e premonições, aduzirei autocrítica que deixei escrita no meu “PROSA CAÓTICA, II” (inédito): Não sei de obras novas criadas por autores velhos. Aos organismos vivos, nos limites da vida, a natureza nega até o poder da reprodução. A criação na velhice aparece como um filho da juventude, esquecido, talvez renegado ou escondido. Na velhice assumimos as coisas por adoção. É duro reconhecer.
Aqui a ocupação da mente. Nada de abstrações, exercícios literários:
“Despedi os últimos pensamentos e com eles as mulheres” – Eis que o Vale me enriquece de lembranças”.         -----------------------------