quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Como anunciei, inicio hoje a publicação neste blog http://eilzopb.blogspot.com, do meu Jornal: “PROSA CAÓTICA II – O Duro Recomeço 1985/2000”, inédito. Entendi assim proceder dada a dificuldade para editoração e publicação impressa de obra puramente literária, memorialística, sem maior destaque ou impor-tância do tema e do autor. Neste espaço acrescentarei notícias e reflexões que achar por bem divulgar, assumindo por isso mesmo, a responsabilidade sobre a crítica favorável ou desfavorável em relação às mesmas. Eventualmente, referências utilizadas em outros textos que constam na seção "comentários do Dia" publicados em eilzomatos.zip.net, poderão ser inseridas, sem configurar repetição nem plágio, dada a correlação da matéria utilizada, também de minha autoria. 
PROSA CAÓTICA II – O Duro Recomeço
Jornal
Prefácio
                  Os textos a seguir organizei-os num mesmo volume, dada a identidade estilístico-temática que os reúne – memória, biografias –, e a unidade ideológica que os integra. Em primeiro lugar combino memórias e reflexões que denomino literariamente “jornal”, o que se torna óbvio pela sua leitura. Colijo artigos e o que chamo de pequenos ensaios, sobre temas para mim relevantes. Alguns foram publicados em jornais ou revistas, outros divulgados em sites na internet.
          Como afirmei em outras oportunidades ao longo de minha vida, amadureci idéias, conceitos, convicções. Muito jovem, ainda, aí pelos dez anos de idade, a candidatura de um parente (Manoel Mariz de Oliveira, tio-afim) a deputado estadual pelo Partido Comunista, chamou a minha atenção para os valores sociais, em razão das discussões sobre o assunto no seio da família.
          A nossa cidade, na época, estava submetida às exigências e ao domínio tutelares da Igreja Católica Apostólica Romana que “amparava as oligarquias mediante o controle do movimento sindical e popular, deles expurgando qualquer traço esquerdizante, fosse radical, socialista, comunista ou mesmo liberal maçônico.”[1]
        Em breve notícia autobiográfica, alinhei referências sobre a minha participação na política partidária da minha cidade, que teve início na Década Sessenta, ao lado de Clarence Pires, Antonio Mariz, Romeu Gonçalves e outros com-terrâneos e amigos. Em eleições seguidas mar-chamos numa frente de atuação comum, tendendo às posições ditas de esquerda no cenário político nacional. A história local confirma os lances dessa militância político-partidária.
                   Considero um dever frisar que, para a avaliação de minha efetiva participação na luta política que dominava o país, a militância levou-me – estudante ainda da Faculdade de Direito do Recife –, na aliança operário-estudantil, em algumas oportunidades, a entrincheirar-me nos piquetes de violentos protestos do proletariado pernambucano, nas greves da “Tecelagem de Macaxeira”, do Sindicato dos Comerciários, na Rua da Imperatriz. Os ideais reconhe-cidamente “apaixonantes e otimistas do marxismo-leninismo e os triunfos imperiais dos exércitos do generalíssimo” (Stálin) na Segunda Guerra Mundial, infundiam persuasão e esperanças na ju-ventude que comentava e estudava a história nas universidades, através de leituras, na imprensa, de debates nos encontros político-culturais.
           Passei, por fim, como cidadão e profissio-nal, a vivenciar os problemas do povo e do país, na urgência do momento, do agora. Buscava um modelo na história brasileira e encontrei-o no reformismo constitucional, dúbio é verdade, que nos legou a chamada Revolução de Trinta. Lutava como ainda hoje o faço, por um governo nacionalista no âmbito da cultura e da economia. Mas, igualmente fraterno, como anunciava o internacionalismo proletário pro-metido pelo socialismo de Estado em voga. E dele não me afastei.
Concluo estas considerações, que visam esclarecer a minha participação nos fatos da história política de Sousa e do país, ao raciocinar em termos atuais, com o sociólogo Emir Sader no seu “As Ruínas da Democracia” (Correio Brasiliense 24 de outubro de 1999), que: “Nós já tivemos mais clareza sobre o que é uma democracia. Hoje as coisas são menos claras.”
Era no tempo em que “a imprensa e os meios de comunicação representavam no contexto democrático, um recurso dos cidadãos contra os abusos dos poderes”. Foi essa peculiaridade corretiva, chamada de Quarto Poder, ao lado do Legis-lativo, Executivo e Judiciário, poderes “que podiam falhar, se equivocar, cometer erros”. (Ignácio Ramondet “Le Monde Diplomatique 2006).
   Por certo período, jornalistas destemidos pagaram caro pela defesa desta tese, foram vítimas de atentados, desaparecimento. Por último, com o advento da globalização liberal e o surgimento de um novo tipo de capitalismo, agora especulativo, eles perderam totalmente a importância e função de instrumentos do contra poder, no processo de comunicação de massa. A mídia teve de se organizar em gigantescas empresas, super poderosas, cuidando desde a produção ideológica de textos até a sua massiva distribuição, assumindo no confronto brutal entre o mercado e o Estado, a defesa do setor privado em oposição aos serviços públicos. Já não era mais “a voz dos sem voz.”
   Não foi possível fugir ao impasse. Era a globa-lização liberal que chegava feroz e implacável. Ficou claro que o novo modelo que assume o capital especulativo formando mega empresas, atuando em escala planetária, tornou o peso dos seus negócios mais importantes que as decisões de governo e de Estado. A mídia participou do processo, incorporando-se aos blocos. Em meu auxílio menciono o instigante e oportuno ensaio de Ignácio Ramonet,[2] lido na internet, que aprofunda a análise do tema.
                 A consciência política da realidade que nos é imposta, de modo cruel e impassível, motivou o protesto do patriota Oduvaldo Vianna Filho[3] que em 1974, antes de falecer denunciava e argumentava: “Reduzir uma sociedade de 100 milhões de pessoas a um mercado de 25 milhões, exige um processo cultural muito intenso e muito sofisticado. É preciso embrutecer esta sociedade com uma força que só se consegue com refinamento dos meios de publicidade, com um certo paisagismo urbano que disfarça a favela, que esconde as coisas.”
                 Tal realidade, produzida por descuidados ou cooptados intelecutais então atuantes no cenário cultural, arrancou, mutatis mutandis, o oportuno grito de protesto do filósofo Olavo de Carvalho: “foi preciso que este país decaísse muito para que se pudesse assistir a este triste espetáculo...” [4]
                 Aí se escondem a manipulação de idéias e de processos, que absorve acriticamente uma coletividade dominada pela incerteza, mas enfatuada, incapacitada intelectualmente para a reflexão e o julgamento. 
                 Nos primeiros anos do Século XXI, passadas apenas três décadas da afirmação de Vianninha, a problemática do Brasil não difere historicamente da do capitalismo internacional como modelo de Estado, alega o citado mestre uni-versitário. É apenas um sócio minoritário e dependente do sistema central, que desempenha um papel “hegemônico” no processo (Florestan Fernandes).
     Finalizando estas considerações acerca da imprensa, recorro ao irretocável argumento do jornalista Sérgio Halimi através do Financial Times  (http://resenha.com.br/esp2991208.htm):
    “Se o fim dos regimes policiais na Europa oriental e o desmoronamento dos dogmas referentes à natureza humana que lhes eram atribuídos nos ensinaram alguma coisa, não foi a necessidade de outro totalitarismo e outra tirania – a dos mercados financeiros. Foi o valor da dúvida e a necessidade urgente da dissidência.” E as suas reflexões que seguem, aplicadas ao jornalismo e à mídia esclarecem:
    “Se aceitarmos a legitimação adulatória de uma nova ditadura, a política não será mais do que o palco de um pseudo-debate entre partidos que exageram a dimensão de pequenas diferenças para melhor dissimular a enormidade das submissões e proibições que os unem... Neste mundo globalizado e totalitário, poderemos ainda, os jornalistas e intelectuais, ser o contrapoder, a voz dos sem-voz? Reconfortar os que vivem no conforto? Como fazer isso quando alguns de nós já pertencem à classe dominante?”
Esta a grande indagação. Quanto a especulações de natureza religiosa, direi como escreveu Herberto Sales: “Não tenho em mim encontrado forças para trocar por outra a minha religião”. E eu acrescento: católica, apóstólica, romana, embora sem presença nos atos cerimoniais e de orações. Não conheço outras, quando muito, raras seitas e perorações de evangélicos espertos, e blá-blá-blá teosófico de funda-mentalistas ou autistas desorientados.
Sousa, dezembro de 2010 
                                 EILZO MATOS



1 - MELLO, José Octávio de Arruda  -  “Sociedade, Cultura e Poder na Paraíba 1939/45” in    Revista da Academia Paraibana de Letras LIV, Jul /Dez, No. 19 , pág 99.
3 - Apud  MENEZES, Jaldes Reis de, “1930 E O BRASIL CONTEMPORÂNEO: REVOLUÇÃO PASSIVA, CAPI-TALISMO TARDIO E DESENVOLVIMENTO DEPENDENTE”  in “ 1930 A REVOLUÇÃO QUE MUDOU O BRASIL” EDUEP 2007.
4 - CARVALHO, Olavo de  “O Imbecil Coletivo” Faculdade da Cidade Editora, Rio  de Janeiro 1996

sábado, 25 de dezembro de 2010

MEMÓRIA VELHA DO NATAL, REFLEXÕES DO PRESENTE.

A minha primeira lembrança do Natal é bastante recuada e assaz im-precisa. Faltam-lhe detalhes. Nasci em família burguesa − naqueles idos dos anos Trinta do século passado −, que foi alcançada, como tantas, com o passar dos anos, pela indesejável decadência financeira e conseqüente diminuição do prestígio social. Pertencíamos, entretanto, a conhecidos clãs destacados na oligarquia política e de atividades comerciais de caráter oligopolista na região, com grande respeitabilidade e presença no dia a dia de cada lugar, o que nos assegurava e ainda nos permite assento entre os privilegiados. E como tal nos comportamos.
O entusiasmo e agitação verificados nas reuniões familiares, nas come-morações religiosas, cívicas marcavam a conduta da época. Vivíamos o período natalino. Pois bem. Entre os quatro ou cinco anos de idade, como de outras vezes, adormeci depois de uma noite de viva e alegre confraternização que reunira adultos e crianças na minha casa enfeitada de adereços, imagens e cenários trabalhados e oferecidos votivamente ao nascimento de Jesus, ex-postos para a admiração de todos. Relembro das empregadas, de minha mãe e algumas amigas, dias a fio, no afã de escolhas e de composições brilhantes, de arranjos coloridos. Depois, o momento da alegria e satisfação de todos com a farta comida e bebida, no estilo característico e próprio da data.  Meu pai com os seus amigos, sorridentes, chamavam-me para conversas que eu pouco entendia, me acariciavam.
Muitos eram os meninos: irmãos, parentes e amigos, que discutiam o que acontecera, o que acontecia e, aconteceria, naquela inabalável certeza de suas afirmações.  Estava em todas as dependências da casa a efígie do Papai Noel, que nos presentearia com objetos sonhados e valiosos para nós. Pre-tendia vê-lo, mas, pegou-me o sono e adormeci atento às promessas de presentes. Na manhã seguinte, acordado pela minha mãe, ela mostrou-me a embalagem colorida, com laço de fita debaixo da rede: o presente de Papai Noel. Desembrulhei-o, corri para a calçada em frente de casa e outras crianças da vizinhança brincavam, já exibiam os seus. Uma coisa triste, entretanto, apertou o meu coração infantil, tão cedo na minha existência: descobri que alguns não traziam o presente que eu pensava seria dado a todas as crianças. Arredios uns, contrafeitos outros disputavam o manuseio dos objetos preciosos.
[...] “Num tempo ainda presente na memória, do Natal guardo recor-dações precisas, uma mistura de comemorações burguesas no seio da família, e o perambular triste e solitário em ruas apinhadas de gente − tempo da infância na casa dos meus pais, e nas ruas do Recife, na juventude, estudante de parcos recursos financeiros, solitário morando em quarto de pensão”.
“O nascimento do Salvador, a significação de Sua vinda ao mundo não me despertaram jamais reflexões profundas. Muito cedo me inculcaram a crença na existência de um Papai Noel, a quem eu deveria prestar contas do meu comportamento de menino e a quem igualmente me dirigir para receber recompensas. Desapareceu com o passar dos anos. O mais era traduzido em farta comida, pratos raros, canções estrangeiras, frenesi comercial e anedotas. Assim também o Ano Novo, sem nada que me induzisse a um inventário de ações. Sozinho na fazenda, distante a cidade recorro à leituras para encher o tempo”. (PROSA  CAÓTICA II – O DURO RECOMEÇO 1985, inédito).
*
Frei Leonardo Boff disse que Papai Noel existe. O problema do Natal “é aprender a ver com os olhos do coração”, ele afirmou,  e divulgou uma carta-poema:
“Queridos irmãozinhos e irmãzinhas:
Se vocês olhando o presépio e me virem aí, sabendo pelo coração que sou o Deus-criança que não veio para julgar mas para estar, alegre, com todos vocês,
Se vocês conseguirem ver nos outros meninos e meninas, especialmente no mais pobrezinhos, a minha presença neles,
Se vocês conseguirem fazer renascer a criança escondida no seus pais e nos adultoss para que surja nelas o amor a ternura,
Se vocês ao olharem para o presépio perceberem que estou quase nuzinho e lembrarem de tantas crianças igualmente pobres e mal vestidas e sofrerem no fundo do coração por esta situação desumana e desejarem que ela mude de fato,
Se vocês ao verem a vaca, o boi, as ovelhas, os cabritos, os cães, os camelos e o elefante pensarem que o universo inteiro recebe meu amor e minha luz e que todos, estrelas, pedras, árvores, animais e humanos formamos a grande Casa de Deus,
Se vocês olharem para o alto e virem a estrela com sua cauda e recordarem que sempre há uma estrela sobre vocês, acompanho-os, iluminando-os, mostrando-lhes os melhores caminhos,
Então saibam que eu estou chegando de novo e renovando o Natal. Estarei sempre perto de vocês, caminhando com vocês, chorando com vocês e brincando com vocês até aquele dia que só Deus sabe quando estaremos todos juntos na Casa de nosso Pai e de nossa Mãe de bondade para vivermos bem felizes para sempre.
Belém, 25 de dezembro do ano 1.” (Carta Maior, Dezembro 2010)
            Nesta ordem de pensamentos, em face da realidade política que nos é imposta, de modo cruel e impassível, chego à constatação que motivou o protesto do patriota Oduvaldo Vianna Filho[1] que em 1974, antes de falecer denunciava e argumentava: “Reduzir uma sociedade de 100 milhões (hoje 197 milhões) de pessoas a um mercado de 25 milhões, exige um processo cultural muito intenso e muito sofisticado. É preciso embrutecer esta so-ciedade com uma força que só se consegue com refinamento dos meios de publicidade, com um certo paisagismo urbano que disfarça a favela, que esconde as coisas.”
           Tal realidade, produzida por gestores descuidados e/ou cooptados intelecutais então atuantes no cenário cultural, arrancou, mutatis mutandis, o oportuno grito de protesto do filósofo Olavo de Carvalho: “foi preciso que este país decaísse muito para que se pudesse assistir a este triste espetáculo...” [2]
           Aí se esconde a manipulação de idéias e de processos, que envolve acriticamente uma coletividade dominada pela incerteza, mas enfatuada, incapacitada intelectualmente para a reflexão e o julgamento.
           Nos primeiros anos do Século XXI, passadas apenas três décadas da afirmação de Vianninha, a problemática do Brasil não difere historicamente da do capitalismo internacional como modelo de Estado, alega o citado mestre universitário. É apenas um sócio minoritário e dependente do sis-tema central, que desempenha um papel “hegemônico” no processo. (Florestan Fernandes).
     Finalizando estas considerações recorro ao irretocável argu-mento do jornalista Sérgio Halimi através do Financial Times acessível em (http://resenha.com.br/esp2991208.htm): “Se o fim dos regimes policiais na Europa oriental e o desmoronamento dos dogmas referentes à natureza humana que lhes eram atribuídos nos ensinaram alguma coisa, não foi a necessidade de outro totalitarismo e outra tirania – a dos mercados financeiros. Foi o valor da dúvida e a necessidade urgente da dissidência.”
 E as suas reflexões que seguem, aplicadas ao jornalismo e à mídia esclarecem: “Se aceitarmos a legitimação adulatória de uma nova ditadura, a política não será mais do que o palco de um pseudo-debate entre partidos que exageram a dimensão de pequenas diferenças para melhor dissimular a enormidade das submissões e proibições que os unem... Neste mundo globalizado e totalitário, poderemos ainda, os jornalistas e intelectuais, ser o contra-poder, a voz dos sem voz? Reconfortar os que vivem no conforto? Como fazer isso quando, alguns de nós, já pertencem à classe dominante?”
Esta a grande indagação, que podemos ou devemos fazer neste Natal.
.............................Sertão, Natal de 2010